Enquanto terapeuta de casais inúmeras vezes me deparo, em sessões, com mitos que assombram os relacionamentos dos casais, uns tornam-se tabus outros tornam-se corrosivos ao ponto de quebrarem ligações afetivas de anos. Comecemos por aquele que é protagonizado e promovido pelas comédias românticas de Hollywood… Felizes para sempre! A felicidade como estado absoluto e permanente não existe!Por muito que estejamos expostos, de forma ostensiva a fotografias adoráveis em cenários paradisíacos de casais que trocam beijos apaixonados ou olhares de cumplicidade, a informação veiculada pelas redes sociais não corresponde à realidade da vida de casal, onde a rotina, a partilha de tarefas, as expetativas, os filhos, as despesas e os objetivos de vida se cruzam e nem sempre caminham no mesmo sentido. A vida a dois irá sempre implicar momentos de felicidade, e esta até pode vir de uma forma pura e intensa, mas acreditar que o casal só funciona quando está permanentemente nesta sintonia é utópico e, sejamos realistas, ingénuo e imaturo. Outra crença comum diz respeito à ideia que quando a paixão acaba o casamento/relação está condenada!Mais uma vez sejamos pragmáticos. A paixão é orgânica, é sensorial, é química é emocional. O aperto no peito, as borboletas no estômago, as arritmias, a libertação de uma serie de substâncias químicas que causam sensações/emoções de tal forma intensas que para alguns se podem tornar viciantes ao ponto de só manterem relações durante o período em que estas produzam este efeito. Neste caso deparamo-nos com os viciados em paixão, incapazes de alcançar o nível seguinte do relacionamento a dois… o amor. Quando entramos no patamar do amor, estamos numa construção racional, não desprovida de emoção, mas emoção mediada pelo escrutínio do pensamento, do que eu gosto, ou não, do que eu quero, ou não, no que eu me identifico, ou não, no que eu me projeto ou não com aquela pessoa. Não menos prejudicial é o mito que as relações são, supostamente, fáceis. Se não está a ser fácil é porque está “destinada” a falhar. Errado. Presentemente, e numa visão mais atual de conflito, é reconhecida a importância do mesmo em qualquer tipo de relacionamento. O conflito impede a estagnação, impede o efeito tóxico da rotina, permite o crescimento pessoal, familiar e relacional. É assustador conviver com casais cujo relato da convivência passa pela total ausência de pontos divergentes, pela ausência de conflito. É provável que uma ou as duas partes da relação já não estejam a investir. Se eu entro em conflito com o meu companheiro/a significa que estou a investir, que estou a envolver-me, que procuro soluções, ou seja que me estou a projetar num futuro com aquela pessoa numa perspetiva de crescimento. Uma frase comum em terapia de casais é “O meu companheiro/a não partilha tudo comigo, é que como se me excluísse de partes da sua vida, para mim a relação só faz sentido se partilharmos tudo.” Este é um dos mais perigosos mitos. Ninguém aguenta viver esfolado sem pele, esta tem uma função vital na proteção dos nossos órgãos. Ninguém aguenta viver esfolado sem intimidade e privacidade. O amor e o carinho por alguém não podem ser medidos pela escala métrica do “o quanto eu lhe conto de todos os aspetos da minha vida”. Todos nós gerimos informação. Facto! Não temos as mesmas conversas com os nossos pais e com os nossos amigos. Mesmo nas amizades a informação é selecionada de acordo com as características da amizade e das pessoas envolvidas. Não estamos a falar da omissão ou da mentira como base de comunicação, são aspetos inteiramente diferentes. A intimidade faz parte do nosso sistema imunitário e como tal merece todo o nosso respeito. “Não deveria ter de me esforçar para comunicar de outra forma com o meu companheiro/a, isso faço no emprego.” O tomar como garantido, subjacente a esta afirmação, é igualmente nocivo para qualquer tipo de relação mais íntima. Os hábitos instalam-se e de um dia para o outro deixamos de nos preocupar em utilizar uma das mais importantes ferramentas comunicacionais, a assertividade. O cuidado com que apontamos ao outro o que nos faz ou não sentido, dá lugar ao ataque desenfreado e à responsabilização do outro pelo nosso mau estar ou anulação pessoal. A assertividade não é um Dom que alguns iluminados tiveram a sorte de ser abençoados. É uma ferramenta relacional que se aprende e se treina. É fantasioso esperar que sejamos assertivos das 7 da manhã às 23h, é idealista almejar que o consigamos ser com todos a toda a hora, mas é fundamental que se recuperem boas práticas de comunicação com os nossos parceiros. “Já sei tudo o que tinha de aprender sobre o que dá prazer e funciona a nível sexual com o meu parceiro/a.” É um bocadinho difícil acreditar que a forma como a sexualidade é experienciada e vivida seja igual aos 20, 40 ou 60 anos de idade. O corpo muda, a pele muda, o cérebro muda, e não nos podemos esquecer que este último é o principal órgão sexual. A relação a dois implica disponibilidade para aprender e evoluir, para comunicar, e na dimensão sexual, muitos dos problemas entre os casais surgem exatamente das falhas de comunicação com reflexo direto da satisfação que retiram da sua vida sexual, quer em termos de quantidade quer em termos de qualidade. A terapia de casal é um espaço próprio onde alguns destes mitos são desconstruídos, onde é criada a possibilidade dos casais promoverem o auto e hétero conhecimento com um mediador imparcial cujo distanciamento emocional da situação permite a sua analise objetiva. Nas sessões são promovidas novas ferramentas relacionais e comunicacionais que permitem quebrar padrões, por vezes rigidamente estabelecidos. Promove-se a assertividade e a empatia num espaço e tempo em que preocupações e receios são debatidos numa perspetiva de construção e desenvolvimento pessoal e relacional. Gostar/amar por vezes não é suficiente existem outras dimensões do relacionamento a dois que precisam ser abordadas e construídas e que servem, a par com os sentimentos, de alicerces à própria relação. Psicóloga Clínica e Life Coach, no Learn2Be Lisboa
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