O ser humano apresenta uma tendência natural para a categorização, isto é, necessita de dar nomes às coisas, de as encaixar sob determinados rótulos, de lhes atribuir um significado facilmente identificável. Fá-lo por necessidade de organização, de compreensão do mundo que o rodeia, de maneira a saber como agir face ao ambiente no qual se movimenta. Quando ouvimos falar de alguém que “anda metido na droga”, podemos tender a rotular essa pessoa, ainda que de forma inconsciente ou automática, de drogada, fraca, desorientada, perdida. Podemos também chegar a apelidar a família daquela pessoa como pouco cuidadora ou desleixada. Será que em algum momento chegamos a pensar, quando ouvimos falar destes casos, de questões como autoestima (a fragilidade de quem se vê a si próprio como fraco ou incompetente), falta de confiança (o sentimento de incapacidade de enfrentar a vida como ela é, com altos e baixos), vazio emocional (a necessidade desajustada de viver emoções fortes que deem algum sentido à nossa existência), medo ou insegurança (a sensação de desproteção face ao mundo que nos rodeia)? E quando um desses casos nos toca à porta, nos entra em casa? Quais são os nossos primeiros pensamentos, os nossos sentimentos mais íntimos? História de uma família a quem o flagelo da toxicodependência bateu à porta. A Luísa tem 46 anos. É casada, tem três filhos de 19, 16 e 11 anos. Partilha, no final da primeira sessão: “Não fazia ideia de que tinha aqui dentro tanta coisa para sair, …, estava com medo de não conseguir falar de tudo isto”. A “droga” entrou-lhe em casa há um ano. O filho mais velho, o António, tinha começado a baixar as notas no final do 11º ano, faltava às aulas, isolava-se dias a fio no quarto, não queria falar com ninguém, reagia agressivamente quando lhe faziam alguma pergunta. A Luísa continua o relato: “Não sabemos o que fazer, nem eu nem o meu marido, como é que isto aconteceu? Mas agora o que importa não é perceber porquê ou quando, ele experimentou, gostou, …, ou fez-lhe sentir-se bem, não sei, mais forte, mais seguro, …, ele sempre foi desportista, sempre rodeado de muitos amigos, sempre com namoradas, não precisava de estudar muito, sempre com bons resultados…” Quando o consumo de estupefacientes se torna numa adição, numa dependência inexoravelmente sentida pelo organismo, quando traduz sensações de êxtase e de evasão, e a sua ausência uma sensação de que a vida é pesada ou insuportável, é toda uma família que se vê enredada num novelo que parece não ter fim. Os pais vivem sentimentos avassaladores de incompreensão e de impotência, perguntando-se milhares de vezes o que fizeram mal e o que podiam ter feito diferente.Perguntam-se ainda mais vezes se haverá, afinal, alguma coisa que poderão fazer para salvar o filho. Relata a Luísa: “Pela primeira vez na vida vi o meu marido a chorar. À mesa do pequeno-almoço, assim que o António entrou na cozinha, o João (marido) não aguentou, só de olhar para a cara dele, desfez-se em lágrimas, …, o aperto que senti naquele momento foi indescritível”. Conta a Luísa: “Ele dirigiu-se ao irmão mais novo com uma raiva na expressão, nunca tinha visto aquilo,…, em segundos o António perdeu a cabeça e virou-se a ele, fisicamente”. São todas as rotinas de uma família que se alteram. A necessidade de libertar o António da dependência da droga e, ao mesmo tempo, de proteger os outros filhos. A premência de retirar o António dos ambientes que costumava frequentar e, ao mesmo tempo, manter os hábitos de programas em família. A urgência de procurar tratamentos, alternativas, opções para o António e, ao mesmo tempo, a disponibilidade para o trabalho que é obrigatório manter. Sempre presente, nesta mãe e neste pai, o sentimento ambivalente de querer fazer tudo pelo filho, por um lado, e baixar os braços devido ao esgotamento físico e emocional que a vivência desta situação acarreta. Se falávamos, há pouco, de questões de autoestima, de medo, de insegurança, de falta de confiança, em relação à pessoa dependente da droga, devemos também lembrar-nos que estes aspetos são transversais a todos os seres humanos e que a dificuldade em lidar com uma situação deste género vai mexer, também, nos mesmos “botões” em relação a cada elemento da família. A Luísa acrescenta: “Não sei se devo acreditar nele, se o devo proibir de sair de casa, se lhe tiro a chave, se lhe dou dinheiro ou não,…, já não sei o que ando a fazer, possivelmente ando a fazer tudo errado”. Estes são excertos da história de uma família a quem o flagelo da toxicodependência bateu à porta. O apoio psicológico e psicoterapêutico é crucial para todos os membros da família que estão envolvidos numa |
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